O céu está coberto de nuvens, hoje. Acho que eu também. Tinha planeado ir à praça buscar flores e dióspiros antes que acabe a época. As nuvens pesam-me e é melhor amanhecer devagarinho. Cheiro de mar é outra coisa, é verdade, mas ainda me falta o sol.
Depois de dois dias de arrumações profundas numa tentativa de resgatar a harmonia e o equilíbrio que nos fogem quando há mudanças, o cansaço instala-se nos músculos e o corpo pede para ceder ao descanso. Não reclamo.
A vida é assim e o caminho é sempre para a frente. Pés assentes no chão é que é mais difícil a quem acredita ter asas invisíveis, e além disso a própria palavra mudAR, pede movimento.
Às vezes gostava que isto fosse uma linha contínua, com menos flutuações, mas provavelmente iria aborrecer-me de morte, porque como costumo dizer, a vida é como a cozinha, e nisso, ainda que respeite as regras e compreenda o que devo ou não fazer, a tendência mais forte é sempre o improviso e a intuição. Fazer o que o coração manda.
Ontem, assim que consegui encaixar o forno no lugar, ainda fiz um bolo de laranja com trigo barbela, a mando do coração e da gula, pronto. Pode faltar tudo, mas bolos, nunca!
Como uma fatia, que sabe sempre melhor no dia a seguir. Devo ser uma das raras criaturas que prefere os bolos frios. A temperatura quente, altera-lhes o sabor.
Faço uma cevada e sento-me a pensar no que devo fazer primeiro, arrumar os livros na estante, as roupas nas gavetas ou ir à praça cheirar as bancas e encher a cesta para me fechar na cozinha e fazer o tempo parar, enquanto tento visualizar uma varinha mágica que entretanto me arruma tudo no devido lugar. Isso é que era!
Ainda devo estar a dormir. Ou de certo, a sonhar. O relógio dos passarinhos que já pendurei na parede chilrea as 10 da manhã e lembra-me que é preciso pensar no que fazer para o almoço. Talvez faça uma massa com grão. Também preciso de um tapete.
Se um dia alguém me dissesse que não ia ser permitido comprar tapetes, eu ia achar que o mundo estava de pernas para o ar, e se calhar até está. Vou tentar fazer o pino para mudar a perspectiva e procurar o sentido. E a seguir vou à praça que está quase a chegar o passarinho das 11 ao relógio da cozinha.
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