sexta-feira, 15 de maio de 2020

Pedincelo

Aleluia! Está sol! Choveu sem parar três dias seguidos. Fiquei a pensar que durante uns tempos é melhor não dizer que a chuva faz falta. É preciso um pouco de sol, agora. Está tudo demasiado ensopado e frio. 
Espreito da janela da cozinha.
Apesar do desconsolo em nós, nota-se uma diferença incrível nas hortaliças!!
Tudo emproou e demarcou terreno. Os espinafres duplicaram o tamanho e os feijões que mal se viam, já trepam. Até as alfaces francesas que são mais sensíveis mostram o que valem.
A chuva faz falta à horta, pronto.
Limpo as migalhas das torradas da mesa de mármore para começar a arranjar os morangos. Ponho o avental e o lenço na cabeça que me faz me sentir que estou pronta, como se carregasse num botão de on. Falta música! As pequenas rotinas que dão conforto e a sensação que tudo está no sítio que é preciso.
Manias de cozinheiras compulsivas.
Os morangos cheiram tão bem! Nunca conheci ninguém que não gostasse deles. Já conheci quem não gosta de chocolate! E até de batatas fritas, que me parece quase impossível! Mas de morangos toda a gente gosta. Deram-nos uma carrada deles e é preciso arranjá-los, lavá-los bem e retirar-lhes os pedunculos.
Será o formato em coração ou o encarnado carnudo que os torna tão irresistíveis? 
Bem, são o fruto de Afrodite e também deve ser por isso que são usados na fase da conquista dos amores.
Com champanhe. A mim, conquistam, se o champanhe for à séria, com um bom equilibrio entre o doce e o seco que arrepia a boca com bolhinhas pétillantes. 
Isto parece petulante, bem sei, e até faz sentido aqui - um francesismo fundamental para transmitir a ideia com a palavra mais bonita e completa. E claro que tem que ser bebido numa flute!
Esta necessidade de dar às coisas a sua devida importância como se de uma demanda se tratasse, pode ser um traço de personalidade um bocado irritante, confesso, mas a idade traz-nos um género de estatuto que permite abrir mão de umas coisas, enquanto assumimos outras e as aceitamos e pronto. É uma mania, só gostar de champanhe em flutes e vinho em copos de pé alto. Mas atenção, não faço birra, facilmente bebo água e aí até pode ser directamente da nascente. E nos morangos também dispenso o açúcar e às vezes até a água para os lavar. É apanhar e meter na boca sem dó nem piedade.
Estes já estão lavados e partidos, vão encher uma tarteira e ainda hão-de chegar para uns frascos de compota.
Que sorte, merecer estas dádivas! E que sorte ter bocas para alimentar e conquistar. Sem champanhe, hoje não há champanhe para ninguém!

 

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