Costumo dizer que as boas ideias estão guardadas numa nuvem cor de rosa e que quando ouvimos a nossa intuição ou seguimos o coração sem regras, acedemos a esse potencial de éter criativo.
Às vezes não sei como se faz. Há tanto barulho, mesmo no silêncio mais profundo que se perde o som do pulsar. Mas também há outros momentos, com sorte, em que a nuvem cor de rosa desce até aos nossos neurónios quando menos se espera.
A maior parte das coisas boas vem quando não se espera, certo? E esperar nem sequer é bom. Bom é usufruir do tempo em que não se pode fazer nada. Em tempos vi um filme que me inspirou muito e embora tente mesmo lembrar-me qual foi, apagou-se da minha memória. Se alguém ler estas palavras e souber do que falo, que se manifeste, por gentileza. Não lembro tampouco personagens, actores, argumento, nada! Só que no geral passava a seguinte ideia - de todas as emoções, o ser humano move-se apenas por duas - o amor e o medo. Todas as outras emoções são simplesmente ramificações, derivações...destas principais. Faz sentido? A mim fez. Às vezes dou por mim a tentar estar bem consciente dos meus actos para ir catalogando o que me está a mover, só para perceber se tem lógica.
Hoje fiz um Bolo de Chocolate branco com Mirtilos. Chocolate branco, ovos, farinha de avelã, mão cheia de Mirtilos - em amor - sem qualquer dúvida! Acendi a lareira - medo - de morrer de frio. Está frio não está? Dei um raspanete à Uva, a fiel rafeira adoptada para que saísse da cozinha não fosse largar pêlo na bancada de mármore que se quer mais imaculada que nunca. Medo - que boicotasse o meu trabalho.
Lavei a louça logo a seguir, não sei bem se - com amor - ao brio que me faz sentir profissional, se - com medo - de falhar às expectativas da minha mãe de eu ser uma dona de casa a preceito.
Entreguei refeições - com amor - alimentar pessoas, mas também - com medo - de deixar de fazer o que tanto gosto. Somos tão frágeis nas nossas pequenas preocupações...É o medo que nos torna estúpidos! Com amor, aceitamos o que temos e fazemos do que temos um tesouro. A vida. Sem as nossas idiossincrasias.
As fragilidades começam a vir ao de cima... e entre reflexões fiquei a pensar se o maior desafio de tudo isto, além de sobreviver, literal e metaforicamente, não será a capacidade de conseguirmos trasmutar as nossas fragilidades e medos, tão expostos agora, com Amor.
terça-feira, 31 de março de 2020
segunda-feira, 30 de março de 2020
Saudade
Ontem fiz favas e agora sempre que as encontro, cozinho-as e tento sempre aproximar-me do sabor das do meu pai.
Faz hoje 14 anos que percebi que às vezes o mundo acaba, mesmo que volte a começar outra vez, a seguir.
Sempre que recomeça, alguma coisa fica para trás e com sorte vem outra ou outras coisas que nos dão alento para viver diferente. Nem melhor nem pior, só diferente. Comigo foi a vontade de cozinhar e de me entregar aos ingredientes numa tentativa de recuperar as memórias e não perder esse alento.
Do latim anhelĭtu-, exalação; respiração,
força necessária para respirar, bafo; força; ânimo; poético inspiração.
Diz tudo, o significado e bate tanto certo no enquadramento. E não deixa de ser curiosa a construção da palavra - a. len.to. lento, devagar, a respirar...
Faz hoje 14 anos que percebi que às vezes o mundo acaba, mesmo que volte a começar outra vez, a seguir.
Sempre que recomeça, alguma coisa fica para trás e com sorte vem outra ou outras coisas que nos dão alento para viver diferente. Nem melhor nem pior, só diferente. Comigo foi a vontade de cozinhar e de me entregar aos ingredientes numa tentativa de recuperar as memórias e não perder esse alento.
Do latim anhelĭtu-, exalação; respiração,
força necessária para respirar, bafo; força; ânimo; poético inspiração.
Diz tudo, o significado e bate tanto certo no enquadramento. E não deixa de ser curiosa a construção da palavra - a. len.to. lento, devagar, a respirar...
O mundo não muda nem acaba, somos nós que nos vamos recomeçando de maneiras diferentes para aprendermos a lidar com o que nos vem e nos vai.
Força. Inspiração. A força que todos acham que temos sempre. Inspiração, que nós precisamos sentir que nunca nos abandona.
O tempo que às vezes não ajuda. Falta-nos o sol que aquece e ilumina e que desperta a luz do interior, como se não soubesses já, Angela Maria, que é a luz de dentro que reflecte a de fora.
Força. Inspiração. A força que todos acham que temos sempre. Inspiração, que nós precisamos sentir que nunca nos abandona.
O tempo que às vezes não ajuda. Falta-nos o sol que aquece e ilumina e que desperta a luz do interior, como se não soubesses já, Angela Maria, que é a luz de dentro que reflecte a de fora.
Lá fora os melros cantam. Tenho a certeza que há outros pássaros, mas eu só ouço os melros. Falam comigo, acho. Dizem-me todos os dias que a vida é uma benção, que o meu sol brilha, que sou forte, que exalo coragem e alento e que inspiro as pessoas e assim, e que vou saber como recuperar aquele sabor verde a hortelã e favas macias que são sempre um reencontro e uma união. Há qualquer coisa de profundamente alquimico numa união. Lembrei-me disto pela capacidade incrível das intenções de pessoas unidas com o mesmo fim.
segunda-feira, 23 de março de 2020
In viscerum
Hoje usei o último dos emplastros para as costas que me compraste. Sempre achei que com dupla intenção. Estas coisas aplicam-se na pele e entranham-se. A substância liberta-se e funde-se, passamos a ser um só. Eu, emplastro e o raio da dor nas costas, mesmo no sacro, desde aquele dia que escorreguei na calçada em Paço d'Arcos quando passeava com a Zézinha. Também já passaram uns 3 ou 4 anos e ainda me dói de vez em quando, só para me lembrar que mesmo que não se manifeste, fundiu-se em mim e também está cá.
Estamos por casa, eu e esta dor que deve ser do tempo, ou da quarentena ou da primavera, ou só porque sim.
Há pouco sai para passear a Uva, completamente indiferente a que o mundo esteja fechado e até feliz da vida que tem os pomares aqui atrás só para ela. Nem carros a passar. Uma vizinha ou outra na rua - do outro lado - a acreditar que são tão rijas que não há mal que lhes pegue. E nós a rezar que assim seja. No ar ainda cheira a lareira, quase em abril!
Ainda há pouco era oficialmente primavera, agora caiu uma carga de água a lembrar que isto não é como nos dá jeito. E está frio. À sombra já faz frio.
Esta-se assim como numa curta metragem mas em câmera lenta.
Apanhei umas pinhas enquanto pensava no que havia de fazer para o jantar.
Tempo de sobra dá fome. Ontem fiz pão. Talvez faça umas migas.
Estamos por casa, eu e esta dor que deve ser do tempo, ou da quarentena ou da primavera, ou só porque sim.
Há pouco sai para passear a Uva, completamente indiferente a que o mundo esteja fechado e até feliz da vida que tem os pomares aqui atrás só para ela. Nem carros a passar. Uma vizinha ou outra na rua - do outro lado - a acreditar que são tão rijas que não há mal que lhes pegue. E nós a rezar que assim seja. No ar ainda cheira a lareira, quase em abril!
Ainda há pouco era oficialmente primavera, agora caiu uma carga de água a lembrar que isto não é como nos dá jeito. E está frio. À sombra já faz frio.
Esta-se assim como numa curta metragem mas em câmera lenta.
Apanhei umas pinhas enquanto pensava no que havia de fazer para o jantar.
Tempo de sobra dá fome. Ontem fiz pão. Talvez faça umas migas.
sábado, 21 de março de 2020
O dia em que o mundo fechou.
Se algum dia estas crónicas passarem a livro, as pessoas que as lerem nesse futuro, vão perceber ( com alguma sorte) as minhas palavras como que num passado muito distante e pseudo desconhecido. Eu também gostaria que nós, os que estamos a viver este presente, nos cruzassemos com essas pessoas para rirmos todos em conjunto. - Sim, esse ano da pandemia foi inesquecível para a saudade. Nunca o isolamento soube tanto a invasão de espaço. Tivemos que ficar em casa e o mundo fechado lá fora.
O mundo fechado tem beleza. Tudo tem. Há beleza nas ruas vazias, no silêncio dos carros parados, nas árvores que até parecem respirar melhor. Nos pássaros em delírio a usufruir da estação a chegar. A primavera ainda que timida, logo tomou posse, altiva e corajosa, a florir cheia de espaço e de tempo por todo o lado.
Espero que por Maio já se possa ir para o campo colher as favas.
Somos tão inúteis que tudo continua a crescer. Não fazemos falta nenhuma ao mundo lá fora. As faveiras estão cheias de flores e vagens a prosperar, completamente indiferentes aos nossos dramas. A chuva cai a estranhar a ausência dos nossos lamentos. O vento sopra as nuvens e a roupa que me esqueci de apanhar e o sol até já voltou outra vez. Os bichos em delírio de ter companhia a toda a hora e nós cheios de sentimentos de culpa por nos estar a saber tão bem parar.
Até os edifícios abandonados parecem felizes de não serem os únicos.
Um dia, quando tudo isto passar vou fazer uma tarte a lembrar a época do mundo fechado, como que em balanço. Já estou em pensar em sabores, enquanto vou escrevendo e lembro que pandemia até rima com pastelaria.
O mundo fechado tem beleza. Tudo tem. Há beleza nas ruas vazias, no silêncio dos carros parados, nas árvores que até parecem respirar melhor. Nos pássaros em delírio a usufruir da estação a chegar. A primavera ainda que timida, logo tomou posse, altiva e corajosa, a florir cheia de espaço e de tempo por todo o lado.
Espero que por Maio já se possa ir para o campo colher as favas.
Somos tão inúteis que tudo continua a crescer. Não fazemos falta nenhuma ao mundo lá fora. As faveiras estão cheias de flores e vagens a prosperar, completamente indiferentes aos nossos dramas. A chuva cai a estranhar a ausência dos nossos lamentos. O vento sopra as nuvens e a roupa que me esqueci de apanhar e o sol até já voltou outra vez. Os bichos em delírio de ter companhia a toda a hora e nós cheios de sentimentos de culpa por nos estar a saber tão bem parar.
Até os edifícios abandonados parecem felizes de não serem os únicos.
Um dia, quando tudo isto passar vou fazer uma tarte a lembrar a época do mundo fechado, como que em balanço. Já estou em pensar em sabores, enquanto vou escrevendo e lembro que pandemia até rima com pastelaria.
quarta-feira, 18 de março de 2020
Hiraeth
O dia mais feliz da minha foi de certeza o dia 6 de Outubro no ano de fim de século, 1999. As previsões apocalípticas do calendário Maia anunciavam o fim do mundo quase a seguir, estava o melhor do meu mundo a começar. Foi um dia cheio de Sol e fomos para o Hospital eram umas 8h da manhã e eu a jurar que - desta vez é mesmo a sério!
Julgo que passamos por uma quantidade infindável de crises existenciais ao longo da vida. Mas, como a perfeição existe no plano divino, também temos uma dose quase proporcional de estados de graça que nos trazem sentido a mais do que tudo.
Pelos meus 25 anos, tive um desses -momentos estado de graça- que tenho a certeza que em milhões de mães a parir por esse mundo, nenhuma experiênciou o que me senti a viver no primeiro segundo que segurei o meu primogénito pela primeira vez.
Na véspera, recebemos amigos para jantar em casa e durante muitos anos, religiosamente, no 5 de Outubro, não celebravamos a implantação da República, mas repetiamos o jantar que era prato favorito da criança - esparguete à Bolonhesa. Ainda hoje, quando o faço, agora na versão vegetariana, viajo para essa altura da vida em que os estados de graça eram infinitamente superiores às crises existenciais.
Não é que passado 20 anos, quase 21, viva em constante sensação de - afinal, quem sou e o que estou a fazer aqui? Mas há momentos que vivemos que são tão profundamente intensos e únicos que os carregamos eternamente num sabor parecido com nostalgia ou saudade e alguns até nem aconteceram ainda.
Lembro, antes dessa fase de maior brilho de sempre, ter a mania de fazer um jogo com as pessoas que ia conhecendo, para testar, de certa forma o quanto sabiamos realmente uns dos outros.
Esse jogo era- se eu fosse ________ (animal, flor, prato, cheiro, canção, etc., o que nos apetecesse, basicamente...) o que seria do ponto de vista do outro e vice-versa.
Se o meu filho mais velho fosse uma fruta, seria sem dúvida uma das exóticas, cheia de cor, sabor intenso, adocicado, textura firme e difícil de descascar.
Julgo que passamos por uma quantidade infindável de crises existenciais ao longo da vida. Mas, como a perfeição existe no plano divino, também temos uma dose quase proporcional de estados de graça que nos trazem sentido a mais do que tudo.
Pelos meus 25 anos, tive um desses -momentos estado de graça- que tenho a certeza que em milhões de mães a parir por esse mundo, nenhuma experiênciou o que me senti a viver no primeiro segundo que segurei o meu primogénito pela primeira vez.
Na véspera, recebemos amigos para jantar em casa e durante muitos anos, religiosamente, no 5 de Outubro, não celebravamos a implantação da República, mas repetiamos o jantar que era prato favorito da criança - esparguete à Bolonhesa. Ainda hoje, quando o faço, agora na versão vegetariana, viajo para essa altura da vida em que os estados de graça eram infinitamente superiores às crises existenciais.
Não é que passado 20 anos, quase 21, viva em constante sensação de - afinal, quem sou e o que estou a fazer aqui? Mas há momentos que vivemos que são tão profundamente intensos e únicos que os carregamos eternamente num sabor parecido com nostalgia ou saudade e alguns até nem aconteceram ainda.
Lembro, antes dessa fase de maior brilho de sempre, ter a mania de fazer um jogo com as pessoas que ia conhecendo, para testar, de certa forma o quanto sabiamos realmente uns dos outros.
Esse jogo era- se eu fosse ________ (animal, flor, prato, cheiro, canção, etc., o que nos apetecesse, basicamente...) o que seria do ponto de vista do outro e vice-versa.
Se o meu filho mais velho fosse uma fruta, seria sem dúvida uma das exóticas, cheia de cor, sabor intenso, adocicado, textura firme e difícil de descascar.
Crime e Quarentena
Num dos meus livros de Astrologia, diz que quem tem Júpiter na 12a Casa, "é como ter um anjo no ombro".
Desde que nasci que sinto isso. Julgo que podia até não acreditar nos astros e não perceber nada de mitologia, que não é o caso e continuaria a sentir as asas ao lado.
A 12a é a casa da mente subconsciente, das forças ocultas, das limitações, Júpiter ou Zeus - senhor dos Céus na Grécia antiga, associado à justiça, à prosperidade, à fé e aos valores mais altos.
Em jeito de lenda podia até parecer que o tempo de recolhimento a que estamos sujeitos agora é um castigo de Zeus aos Homens que tanto têm desprezado este planeta incrível que temos a sorte de habitar.
Noutro tempo, para acalmar a Sua ira, seriam certamente feitas muitas preces e rituais apaziguadores. Os Deuses gregos 'alimentavam-se' das preces dos comuns mortais. Enfim, Dostoiévski à parte, a nós está a ser pedido que nos cuidemos e ajudemos a cuidar, estamos a ter a dádiva - alguns de nós- de podermos tentar corrigir alguns erros, de alterarmos atitudes egoístas e individualistas e lembrar que somos uma enorme família. Nas famílias todos tomamos conta. Protegemos, educamos, brincamos, chamamos à atenção quando alguém se esquece de fazer a sua parte. Acolhemos. É isto que precisamos ser agora, uma grande família universal.
Sou asmática, sofro de renites alérgicas e tenho 46 anos. Vejo, na minha limitação duas formas de encarar este drama ou todos os outros da vida - com coração de coragem e fé ou com ansiedade e medo. O medo enfraquece o sistema imunitário. A fé une a algo maior que nós e que todas as doenças do mundo.
Acho que a maior das capacidades humanas está na criatividade de saber transformar a dor, o sofrimento, a sombra, em luz, esperança e beleza.
Coração aberto, queixo para cima, corpo cuidado. Que os anjos vos acompanhem.
A 12a é a casa da mente subconsciente, das forças ocultas, das limitações, Júpiter ou Zeus - senhor dos Céus na Grécia antiga, associado à justiça, à prosperidade, à fé e aos valores mais altos.
Em jeito de lenda podia até parecer que o tempo de recolhimento a que estamos sujeitos agora é um castigo de Zeus aos Homens que tanto têm desprezado este planeta incrível que temos a sorte de habitar.
Noutro tempo, para acalmar a Sua ira, seriam certamente feitas muitas preces e rituais apaziguadores. Os Deuses gregos 'alimentavam-se' das preces dos comuns mortais. Enfim, Dostoiévski à parte, a nós está a ser pedido que nos cuidemos e ajudemos a cuidar, estamos a ter a dádiva - alguns de nós- de podermos tentar corrigir alguns erros, de alterarmos atitudes egoístas e individualistas e lembrar que somos uma enorme família. Nas famílias todos tomamos conta. Protegemos, educamos, brincamos, chamamos à atenção quando alguém se esquece de fazer a sua parte. Acolhemos. É isto que precisamos ser agora, uma grande família universal.
Sou asmática, sofro de renites alérgicas e tenho 46 anos. Vejo, na minha limitação duas formas de encarar este drama ou todos os outros da vida - com coração de coragem e fé ou com ansiedade e medo. O medo enfraquece o sistema imunitário. A fé une a algo maior que nós e que todas as doenças do mundo.
Acho que a maior das capacidades humanas está na criatividade de saber transformar a dor, o sofrimento, a sombra, em luz, esperança e beleza.
Coração aberto, queixo para cima, corpo cuidado. Que os anjos vos acompanhem.
terça-feira, 17 de março de 2020
Águas de Março
Março, sempre foi para mim o mês mais bonito. O meu pai 'partiu' neste mês que até também levou o meu sogro... Mas Março traz a primavera, as glicínias e buganvílias, as minhas irmãs, a minha mãe e o meu Oliver. A tia Catarina também!
Desta vez trouxe uma quarentena e como em quase tudo, estou a tentar ver o positivo na situação. O que gostava mesmo era de ter um género de albergue para enfiar todos os que gosto e ter a certeza que estão bem nutridos de corpo e alma, que somos o que comemos e também o que fazemos da vida quando o tempo não tem relógio.
Ontem decidimos pintar, ou usar materiais de pintura, pronto. Talvez o verbo se use só para quem domina as técnicas na perfeição. A minha lua em virgem tem estes graus de exigência, pois claro. Também tirámos cartas para tentar adivinhar o futuro, outra tecnica que praticamos com muito amadorismo, mas fé. Lemos e cuidamos do jardim. Decidimos o que já tinhamos intenção há tempos e foi de mãos à obra. Temos cebola roxa, coentros, brócolos, pimento amarelo, tomate cherry e beringelas. Acho que também plantei pepinos. Claro que não quis catalogar. Quero reconhece-las e observa-las como amigas de longa data. Ah! Beterrabas, espinafres e morangos.
Também tenho farinha para dar uso à máquina do pão que em tantos anos de espera na prateleira, finalmente tenciono desempoeirar.
Das cartas, veio o Sol. Boas notícias! Como que já em antecipação ao fim da tempestade em que estamos todos metidos. O sol é sempre um bom auguro e também me faz crescer a horta.
Pássaros. Tantos! Há alguma poesia neste ritmo que não cumpre horários nem reuniões ou procedimentos inadiáveis mundanos.
Tudo é adiavel. Põe-nos em prespectiva, certo?
Daqui consigo ver as pereiras a despontar flores em cada ramo, quais amendoeiras a fingir neve. Estas árvores crescem a fazer lembrar uma mão, mas com muitos dedos, que cresce do chão como se movesse num bailado. Quando se olha com atenção, apesar de aparentemente estáticas, são árvores...juro que estão em movimento subtil constante e que esse 'movimento' tem um som.
Se o pomar fosse uma orquestra, a pereira seria o maestro. Assim, consigo passar a ideia. Nesta sinfonia, fui para a minha divisão favorita da casa. A cozinha!
Hoje fiz Açorda de Espargos para o Almoço. Eapargos biológicos, que dádiva!
Perdoem-me, mas o tempo pode parar.
Desta vez trouxe uma quarentena e como em quase tudo, estou a tentar ver o positivo na situação. O que gostava mesmo era de ter um género de albergue para enfiar todos os que gosto e ter a certeza que estão bem nutridos de corpo e alma, que somos o que comemos e também o que fazemos da vida quando o tempo não tem relógio.
Ontem decidimos pintar, ou usar materiais de pintura, pronto. Talvez o verbo se use só para quem domina as técnicas na perfeição. A minha lua em virgem tem estes graus de exigência, pois claro. Também tirámos cartas para tentar adivinhar o futuro, outra tecnica que praticamos com muito amadorismo, mas fé. Lemos e cuidamos do jardim. Decidimos o que já tinhamos intenção há tempos e foi de mãos à obra. Temos cebola roxa, coentros, brócolos, pimento amarelo, tomate cherry e beringelas. Acho que também plantei pepinos. Claro que não quis catalogar. Quero reconhece-las e observa-las como amigas de longa data. Ah! Beterrabas, espinafres e morangos.
Também tenho farinha para dar uso à máquina do pão que em tantos anos de espera na prateleira, finalmente tenciono desempoeirar.
Das cartas, veio o Sol. Boas notícias! Como que já em antecipação ao fim da tempestade em que estamos todos metidos. O sol é sempre um bom auguro e também me faz crescer a horta.
Pássaros. Tantos! Há alguma poesia neste ritmo que não cumpre horários nem reuniões ou procedimentos inadiáveis mundanos.
Tudo é adiavel. Põe-nos em prespectiva, certo?
Daqui consigo ver as pereiras a despontar flores em cada ramo, quais amendoeiras a fingir neve. Estas árvores crescem a fazer lembrar uma mão, mas com muitos dedos, que cresce do chão como se movesse num bailado. Quando se olha com atenção, apesar de aparentemente estáticas, são árvores...juro que estão em movimento subtil constante e que esse 'movimento' tem um som.
Se o pomar fosse uma orquestra, a pereira seria o maestro. Assim, consigo passar a ideia. Nesta sinfonia, fui para a minha divisão favorita da casa. A cozinha!
Hoje fiz Açorda de Espargos para o Almoço. Eapargos biológicos, que dádiva!
Perdoem-me, mas o tempo pode parar.
quarta-feira, 4 de março de 2020
Coração e Feijão
Da minha avó Miquelina, mãe do meu pai, infelizmente não tenho muitas memórias, apesar de ter percebido em histórias dos meus irmãos que lhe devo ter herdado algum “pelo na venta” e o meu lado mais contemplativo. O meu irmão Paulo conta que por vezes quando o meu avô ia ao serrado apanhar ou cultivar alguma coisa, que ela o levava ainda pequenito e lhe mostrava as arvores e ensinava o que eram, lhe dava a cheirar as flores e apontava para os pássaros. Nasceu a quatro de Janeiro, o meu pai nasceu a três, mas não me lembro de ser tão destemido quanto ela. Deve ter saído mais ao meu avô que parece que era meio medricas e se assustava com tudo o que era bicho.
O meu irmão conta que um dia qualquer, no quintal da casa onde moravam, atrás de um tanque onde ela adoçava os tremoços, apareceu uma cobra e o meu avô ficou em pânico. Consta que a destemida Miquelina Maria, muito confiante, fez uns gestos quaisquer com o dedo indicador até a cobra inofensiva, parece, levantar a cabeça. Posto isto, a minha determinada avó paterna, pegou-lhe cheia de coragem e atirou-a para o outro lado do muro, enquanto troçava do meu avô que tinha perto de 1.90m de altura mas que se portava como um menino aos olhos dela. Consta que além de Doces maravilhosos (onde nasceu a inspiração das minhas Pérolas de Colares)fazia a melhor Sopa de Feijão do Mundo!
terça-feira, 3 de março de 2020
Mãe coragem.
A minha mãe queria ser professora e ter doze filhos, mas à minha irmã Margarida que só foi a segunda, já queria desistir.
Sabem aquelas pessoas que não deixam ninguém indiferente por onde passam? A minha mãe é assim. Toda a gente a adora porque se entrega muito e tem um coração gigante, sempre pronta para ajudar tudo e todos até quando lhe pedem para não o fazer... Sempre activa e incansável. Tirou o ciclo já eu era nascida, que dantes nestas terrinhas tirava-se a 4ª classe, quando se tirava... e depois era trabalhar, ainda na meninice. Aprendeu a falar francês para comunicar com o meu primo Laurent que vinha nas férias com o tio Mário e a tia Maria (uma francesa de Itália com quem o tio casou quando emigrou). E ela era ginástica, era grupo coral, era voluntariado, era cantorias e danças no lar onde se ficou a minha avó e estão agora as duas irmãs, as minhas tias, a Catarina e a Melita.
É sempre bola para a frente e tudo para cima.
Uma força da natureza com uma coragem e determinação invejáveis e uma resistência única. Já passou por muito, a minha mãe.
Quando eu apareci tinha entrado nos trintas e já oito anos antes quando nasceu a minha irmã Ana, tinha pensado onde raio estaria com a cabeça quando sonhava ter doze...
Esteve um pouco doente nessa altura e teve um apoio muito grande da cunhada Maria que me adorava e tomava conta de mim para a minha mãe descansar.
Esta Maria nasceu no dia dos namorados há muitos anos atrás e já há algum tempo que decidiu partir. Não teve a graça de poder ter filhos, mas agraciou todos os muitos sobrinhos com privilégios e amores ainda maiores que alguns laços maternos. Eu tive a sorte de além de sobrinha ser afilhada, de muitas vezes ainda bebé, dormir na gaveta de roupeiro a servir de berço que abria ao lado da cama. De partilhar com ela os lanches de Mokambo e pão com manteiga, dos passeios pelas escadarias da Sé de Leiria e do cheiro a colónia da Ach Brito ou dos sabonetes dentro das gavetas a perfumar os lençóis.
Ainda tenho toalhas de mesa de rendas feitas por ela e devo ter usado uma carrada de camisolas que ela tricotava numa maquineta que tinha.
A Maria Constança veio abençoada com o dom de espalhar amor e carinho por onde passasse, talvez por ter nascido no dia dos amores. Vejo-a como se fosse hoje, ainda nos tempos em que se lembrava de quem era, muito direitinha e arranjada, cabelo impecavelmente arrumado, perfumada e engomada a dar exemplo a todas as Marias por onde passou. Sim, venho de uma família em que as Marias não vão nem são como as outras. Esta ia atrás dos sobrinhos ou do meu tio Isildo, irmão mais velho do pai de quem eu gostava tanto!
A primeira vez que andei de carro, deve ter sido no Mini Morris bordeaux dele e ainda me lembro do cheiro a novo que o raio do carro nunca perdeu. Ele também o tratava quase melhor que tratava a sua Maria. DI-37-41, sim, também me lembro da matrícula.
Bem, na verdade, a primeira vez que eu andei de carro deve ter sido quando nasci para sair da maternidade em Torres Novas para regressar a casa.
No domingo em que nasci - ao meio dia, diz a minha mãe com toda a precisão porque ouviu as badaladas do sino a chamar para a missa e a irmã Blandina, a parteira, a refilar com o raio do timing que eu tinha escolhido para aparecer- estava um belo dia de sol, apesar do Inverno já estar à porta.
No mesmo quarto estava uma cigana que deu à luz duas gémeas. A minha mãe ainda hoje conta a história que a senhora não conseguia amamentar as duas crias e que o fez a uma delas. Desculpem se sou demasiado gráfica, mas partilhei a mama da minha mãe com uma pequena ciganita e se calhar é dai que vem o meu lado nómada e a mania de achar que adivinho coisas. Menos os números da lotaria, claro...
E também deve ser por ter nascido no tempo frio, mas num dia luminoso e colorido que gosto tanto do outono. Também gosto de dar cor às vidas e sobretudo sabor.
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Coração na lua
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